Texto por Mathias Bloch

Lech Lechá é uma das parashot mais emblemáticas da Torá, inicia com o momento no qual Avram está em sua casa e tranquilo, confortável e contente, até que D’us acaba com isso tudo dizendo:

“Vai-te de tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que te mostrarei. E farei de ti uma grande nação e abençoar-te-ei, e engradecerei teu nome e serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem, e aqueles que de amaldiçoarem, amaldiçoarei; e serão benditas em ti todas as famílias da terra.” (Bereshit 12:1-3)

Mas para onde Avram vai? Isso não fica claro, e sabemos que ele não sabe até o momento, o que ele sabe é que tem que sair da sua casa, deixar seu pai idoso e tudo que tinha para trás, para ouvir o pedido de D’us e ir para um lugar que ele se quer sabe onde é.

Mesmo com D’us pedindo, muitos considerariam ignorar o chamado, talvez alguns tenham ignorado. Mas a realidade é que Avram acorda cedo, no dia seguinte, e vai, mesmo sem saber ao certo qual é seu destino.

Inicia-se aqui a história do povo judeu, uma história que se repete várias vezes pelos séculos, onde D’us chama o povo como fez com Avram, dizendo: “não se iludam pela situação de conforto, de segurança, levantem e trabalhem na direção que estou apontando.”

A Torah reforça essa ideia em Devarim dizendo:

“Tenho dado perante vós a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolha, pois, a vida, para que vivas tu e tua descendência, amando a H’Shem, teu D’us, ouvindo a Sua voz e te achegando às Suas qualidades…” (Devarim 30:19-20)

Ou seja, Avram foi o primeiro a ouvir o “Lech Lechá“, saia do teu conforto e vá! O Rav Noach Weinberg z’l, gostava de citar a ideia de que a vida é feita para ser vivida com atenção, atento àquilo que acontece ao nosso redor, com aqueles que amamos e aqueles que não somos próximos, mas principalmente àquilo que foi dito por D’us na Torá: à voz Dele.

Todos passam por desafios na vida, mas a justiça divina não permite que esses problemas estejam acima daquilo que somos capazes de superar, seja individualmente ou como comunidade/povo. Portanto, enfrentar as adversidades, sem saber para onde vamos exatamente, faz parte de ouvir à voz de D’us, assim como Avram fez.

Ainda temos uma vantagem diante daquilo apresentado à Avram: temos a Torá de forma clara hoje, disponível. Chamamos essa de Torat Chaim – leis para a vida, não é por acaso, é um manual de instruções para podermos enfrentar as dificuldades. O mesmo Rav Weinberg z’l, perguntava como seria possível um eletrônico qualquer vir sem nenhum tipo de manual? Uma vez que ele tem uma função a cumprir, temos que saber usá-lo para que possa cumprir tal função, e para isso, todos vêm com um manual de instruções.

Se qualquer criador humano é capaz de perceber a necessidade de um manual de instruções para a sua invenção, quanto mais o Criador do Universo, para a sua criação, e isso é a Torá, não um mero conjunto de historinhas com lições rasas de moral, muito pelo contrário: a Torá é o conjunto de conhecimentos necessários para vencermos qualquer obstáculo que o mundo possa colocar diante de nós.

Mas ainda somos humanos, sentimos medo e ansiedade quanto ao objetivo final. Sair da zona de conforto nunca é fácil, ficar atento exige energia e vontade. Por isso D’us, ao final da parashá tranquiliza Avram e, consequentemente, nós também, dizendo:

“Não temas, Avram, Sou teu escudo, sua recompensa será grande” (Bereshit 15:1).